O Juízo da 1ª da Fazenda Pública de Porto Velho negou o pedido de liminar na Ação Anulatória 7010009-46.2019.8.22.0001, impetrada pelo ex-prefeito de Candeias do Jamari, Luis Ikenohuchi, para que ele retornasse ao cargo. O pedido é o primeiro recurso feito pelo ex-prefeito após ser cassado pela Câmara Municipal de Candeias do Jamari, com base em várias irregularidades detectadas pelo Tribunal de Contas do Estado.
Luis Ikenohuchi alega que houve irregularidades na condução do processo que culminou com sua cassação. Uma delas é a participação do presidente da Câmara Municipal Lucivaldo Fabrício de Melo, que agora é o prefeito interino. Segundo o prefeito cassado, Fabrício não poderia compor a comissão processante porque tinha interesse direto na vaga, uma vez que seria o principal beneficiado com a cassação.
A juíza Inês Moreira da Costa, ao negar a liminar deixou claro “não compete ao Judiciário analisar o MÉRITO de decisões do Poder Legislativo, sob risco de se ofender o princípio da separação dos poderes”, apesar de ressaltar que a limitação não é absoluta, “cabendo ao Judiciário apenas a análise da legalidade de certos atos administrativos”. Mas esse não foi o motivo da negação da liminar.
De acordo com a magistrada, não houve descumprimento da legislação. Segundo ela, o prefeito interino Lucivaldo Fabrício só não poderia fazer parte da comissão processante se ele fosse o denunciante. A denúncia, segundo a magistrada, partiu de um cidadão da cidade e, portanto, os argumentos do ex-prefeito não são capazes de reverter a decisão administrativa do Legislativo Municipal.
CONFIRA A SENTENÇA:
Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia
PODER JUDICIÁRIO
Porto Velho - 1ª Vara da Fazenda Pública 7010009-
46.2019.8.22.0001 - Procedimento Comum
POLO ATIVO
AUTOR: LUIS LOPES IKENOHUCHI HERRERA, RUA
PRESIDENTE MÉDICE 179 SATÉLITE - 76860-000 - CANDEIAS
DO JAMARI - RONDÔNIA
ADVOGADO DO AUTOR: BRENO MENDES DA SILVA FARIAS
OAB nº RO5161, LAERCIO FERNANDO DE OLIVEIRA SANTOS
OAB nº RO2399, MANOEL VERISSIMO FERREIRA NETO OAB
nº RO3766
POLO PASSIVO
RÉU: C. M. D. C. D. J., RUA TANCREDO NEVES 1781 BAIRRO
UNIÃO - 76860-000 - CANDEIAS DO JAMARI - RONDÔNIA
ADVOGADO DO RÉU:
DECISÃO
LUIZ LOPES IKENOHUCHI HERRERA promove Ação Anulatória
com pedido de tutela provisória de urgência contra a CÂMARA
MUNICIPAL DE CANDEIAS DO JAMARI visando obter provimento
jurisdicional que anule a sessão de julgamento que cassou seu
mandato de Prefeito do Município de Candeias do Jamari – RO.
Fundamenta seu pedido em vício insanável quanto a formação
da comissão processante responsável pelo processo político
administrativo e na insubsistência do relatório preliminar da equipe
técnica do TCE, referente à prestação de contas do exercício de
2017, que serviu como fundamento da denúncia feita contra si.
Busca, em sede de tutela provisória de urgência para suspender os
efeitos do Decreto Legislativo n.º 02/2019, reintegrando-o ao cargo
de Prefeito do Município de Candeias do Jamari – RO.
A Câmara Municipal de Candeias do Jamari se manifestou por meio
da petição id. 25496220. Alega litispendência com o MANDADO de
segurança n. 7050904-83.2018.8.22.0001.
É o relato. Decido.
Inicialmente, deve-se deixar claro que não compete ao Judiciário
analisar o MÉRITO de decisões do Poder Legislativo, sob risco de
se ofender o princípio da separação dos poderes. No entanto, essa
limitação não é absoluta, cabendo ao Judiciário apenas a análise
da legalidade de certos atos administrativos.
Partindo dessa premissa e considerando o momento processual,
esta DECISÃO se limitará a verificar a probabilidade do direito
alegado pelo autor e a existência da urgência da medida, requisitos
estabelecidos pelo art. 300 do CPC. Assim sendo, a probabilidade
do direito estará na existência de indício de ilegalidades no
processo instaurado para cassar o mandato do Chefe do Executivo
Municipal.
Não há que se falar em conexão ou litispendência com o MANDADO
de segurança n.º 7050904-83.2018.8.22.0001, uma vez que o autor
desistiu da ação mandamental.
Em síntese, o autor, então Prefeito de Candeias do Jamari – RO,
foi denunciado com base em relatório técnico preliminar do TCE,
que apontou irregularidades que teriam o condão de afastá-lo de
suas funções. Em razão disso, foi instaurado procedimento de
afastamento, que se deu nos termos do Decreto-Lei n.º 201/67, o
qual dispõe sobre a responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores.
O autor entende que este procedimento é eivado de vícios
insanáveis, aptos a tornar nula a DECISÃO de cassação.
A primeira nulidade seria o fato de que o Presidente da Câmara
Municipal compôs a comissão processante que afastou o autor
de seu cargo. De acordo com o autor, o vereador em questão
seria impedido de compor a comissão, porque figurava na linha
sucessória do cargo, o que revelaria seu interesse na DECISÃO.
Esta alegação estaria fundamentada nos incisos I e II do art. 5º do
Decreto-Lei n.º 201/67. Transcrevo a redação do inciso, utilizado
como fundamento pelo autor:
Art. 5º O processo de cassação do mandato do Prefeito pela
Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá
ao seguinte rito, se outro não for estabelecido pela legislação do
Estado respectivo:
I - A denúncia escrita da infração poderá ser feita por qualquer
eleitor, com a exposição dos fatos e a indicação das provas. Se o
denunciante for Vereador, ficará impedido de votar sobre a denúncia
e de integrar a Comissão processante, podendo, todavia, praticar
todos os atos de acusação. Se o denunciante for o Presidente da
Câmara, passará a Presidência ao substituto legal, para os atos do
processo, e só votará se necessário para completar o quorum de
julgamento. Será convocado o suplente do Vereador impedido de
votar, o qual não poderá integrar a Comissão processante.
II - De posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira
sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o
seu recebimento. Decidido o recebimento, pelo voto da maioria
dos presentes, na mesma sessão será constituída a Comissão
processante, com três Vereadores sorteados entre os desimpedidos,
os quais elegerão, desde logo, o Presidente e o Relator.
O inciso primeiro possui uma redação dúbia. Entretanto, é possível
interpretá-lo da seguinte maneira: estaria impedido de votar
sobre a denúncia e compor a comissão processante o vereador
denunciante, sendo convocado seu suplente, que também não
poderá integrar a comissão processante. Caso esse vereador
denunciante seja Presidente da Câmara, seu substituto legal ficará
responsável pelos atos do processo e este substituto somente
votará para completar o quórum.
Portanto, pela leitura do DISPOSITIVO, o Presidente da Câmara
somente não poderá ser responsável pelos atos do processo se
ele for o denunciante, caso em que passará essa responsabilidade
ao seu substituto.
Afastado da presidência, não comporá a comissão, participando
apenas dos atos de acusação, uma vez que se submeteria a
primeira parte do DISPOSITIVO.
Assim, o DISPOSITIVO, embora tenha redação confusa, não
estabelece outros impedimentos que não seja o fato de ter sido
denunciante. Ou seja, o fato de ser o próximo da linha sucessória,
já que o autor era suplente de Chico Pernambuco, ao menos em
uma análise supercial dos fatos e fundamentos jurídicos elencados,
não é tido pelo DISPOSITIVO como um impedimento para fazer
parte da comissão.
Como a denúncia foi feita por um cidadão de Candeias, em princípio
não se verifica a probabilidade do direito alegado.
Por fim, quem figurava como presidente da Casa de Leis à
época da comissão processante não era a pessoa indicada pelo
autor. Entretanto, este fato poderá ser elucidado com a instrução
processual.
Quanto ao segundo fundamento, a falta de justa causa para
instalação da comissão processante, estaria no fato de que a
denúncia teria se utilizado de relatório preliminar da equipe técnica
do TCE, referente à prestação de contas do exercício de 2017.
Segundo o autor, mero relatório não possuiria força probante da
má gestão ou malversação de recursos. No seu entendimento,
somente haveria força probante a DECISÃO dada pelo Conselheiro
Relator ou deliberação e apreciação pelo Pleno do TCE.
De maneira mais simplificada, o autor alega sua “presunção de
inocência”, pois defende que somente estaria demonstrado motivo
para instauração da comissão, com o julgamento do TCE.
Além disso, a natureza jurídica do parecer prévio permite sua
utilização para subsidiar o julgamento das contas pelo Legislativo. É
o entendimento do TCE/MG (http://revista1.tce.mg.gov.br/Content/
Upload/Materia/1745.pdf ):
EMENTA: PRESTAÇÃO DE CONTAS — PREFEITURA
MUNICIPAL — EMISSÃO DE PARECER PRÉVIO — PEÇA
TÉCNICO-JURÍDICA OPINATIVA — AFASTADA INCIDÊNCIA
DA PRESCRIÇÃO — JULGAMENTO PELO LEGISLATIVO —
DIMENSÃO METAINDIVIDUAL — DIREITO DA COLETIVIDADE
— II. PROPOSTA DE PARECER PRÉVIO PELA APROVAÇÃO
DAS CONTAS ANUAIS PRESTADAS 1. O parecer prévio emitido
pelo Tribunal de Contas constitui peça técnico-jurídica de natureza
opinativa, com o objetivo de subsidiar o julgamento das contas pelo
Legislativo. 2. Não se admite a interposição de limitação temporal à
atuação do Tribunal de Contas, quando o julgamento das contas de
governo, outorgado ao Poder Legislativo, possa, por via reflexa, ser
obstaculizado, tendo em vista tratar-se de direito da coletividade.
Também é a redação do art. 31, §2º da CF/88:
Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder
Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas
de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.
§ 1º O controle externo da Câmara Municipal será exercido com
o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município
ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde
houver.
§ 2º O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as
contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de
prevalecer por DECISÃO de dois terços dos membros da Câmara
Municipal.
Assim, em uma análise puramente superficial dos fatos e
fundamentos jurídicos utilizados pelo autor, o pedido de liminar
deverá ser indeferido diante da ausência de demonstração da
probabilidade do direito exigido pelo art. 300 do CPC/15.
Intime-se o autor para complementar o recolhimento das custas.
Comprovado o recolhimento, cite-se o requerido para contestar.
Havendo preliminares, intime-se para réplica.
Porto Velho , 22 de março de 2019 .
Inês Moreira da Costa
Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia
Av. Lauro Sodré, nº 1728, Bairro São João Bosco, CEP 76.803-
686, Porto Velho, RO
Tribunal de Justiça de Rondônia
Este diário foi assinado digitalmente consoante a Lei 11.419/06. O documento eletrônico pode ser encontrado no sítio do Tribunal de Justiça do Estado de
Rondônia, endereço: http://www.tjro.jus.br/novodiario/
Fonte: VIA RONDÔNIA
Publicada em 26 de March de 2019 às 09:22