
A autorização da Justiça carioca para quebrar os sigilos bancários do senador Flávio Bolsonaro, de seu ex-assessor Fabrício Queiroz, de familiares e empresas de ambos, além de uma mutidão de outros assessores ao longo de um período de dez anos, será o maior desafio político do governo Jair Bolsonaro nos próximos meses.
Não há como reduzir o impacto negativo da notícia. Bolsonaro foi eleito, entre tantos outros motivos, com um discurso explícito de combate à corrupção petista. Aí o principal assessor de seu filho durante anos foi flagrado em movimentações bancárias suspeitas pelo organismo encarregado de investigar falcatruas financeiras, o Coaf.
Flávio já deu diversas explicações para os fatos que vieram à tona, como depósitos sequenciais em dinheiro num caixa eletrônico e lucros improváveis na venda de imóveis. O próprio presidente Bolsonaro teve de explicar um cheque de Queiroz depositado por sua mulher.
A quebra do sigilo bancário trará, porém, um sem-número de novas histórias e questões sobre o fluxo financeiro no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Queiroz operava mesmo um esquema de desvio dos salários dos assessores? Ou era, como chegou a afirmar, só um “cara de negócios” que vendia carros? Se estava metido em maracutaias, como se explica que Flávio nada soubesse?
Por enquanto, a quantidade de perguntas vai além da capacidade das autoridades para respondê-las. Será papel das investigações deslindar todos os nós no novelo retorcido de explicações para as histórias suspeitas. Flávio tem toda razão em se preocupar com a exploração política dos fatos. Não haverá como evitá-la.
Está justamente aí o principal risco para o governo Bolsonaro. Num momento de refluxo da Operação Lava Jato, em que o Supremo Tribunal Federal (STF) se encarrega de adotar as interpretações mais generosas e favoráveis aos réus, um escândalo que atinge os Bolsonaros poderá ocupar meses de manchetes.
Cada passo e investida das autoridades será notícia. A oposição tratará de usar o que tiver ao seu alcance para tentar barrar as iniciativas do governo no Parlamento. Uma vez que Bolsonaro ocupa a Presidência da República, tudo o que o atinge, direta ou indiretamente, tem maior valor noticioso que qualquer outra investigação.
O ex-presidente Michel Temer está preso, todo enrolado com as suspeitas de que tenha usado as obras da usina de Angra 3 como fonte ilegal de recursos de campanhas eleitorais. Foi citado na delação do dono da Gol, Henrique Constantino, como beneficiário de R$ 7 milhões em recursos ilícitos. Na mesma delação, Constantino afirmou ter concedido “benefícios financeiros” ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Temer e Maia negam tudo.
Por mais que todos esses fatos sejam investigados e comprovados, não têm as mesmas implicações políticas de um escândalo que pode atingir o presidente da República ou, no mínimo, pôr em xeque a credibilidade de seu filho. Se Bolsonaro quer o bônus de ter uma prole ativa politicamente, a ajudá-lo na Câmara, no Senado ou nas redes sociais, não há como evitar arcar com o ônus.
Por enquanto, Flávio evitou responder às autoridades diretamente, mas deu diversas entrevistas com explicações para o comportamento esquisito de Queiroz e para as suspeitas despertadas pelas transações. É perfeitamente possível que, ao final das investigações, consiga provar sua inocência e saia ileso.
Politicamente, porém, é o que menos importa. Política é o terreno da percepção. A partir do momento em que Flávio tem de dar explicações, sua imagem queimada prejudica o discurso anticorrupção do governo.
E pode não ficar por aí. Que tipo de informação a quebra de sigilo de tanta gente por tanto tempo trará sobre o próprio presidente Bolsonaro? Até que ponto porá em risco seus projetos e seu próprio governo? O brasileiro aguarda ansioso a resposta das autoridades.
Fonte: G1
Publicada em 14 de May de 2019 às 09:35